Nesses trinta dias que passei em orfanatos tive inúmeros momentos de alegria com o carinho que recebi das crianças. Mas no último dia no Vietnã presenciei uma cena que nunca mais vou esquecer e que espero levar como lição para nunca mais reclamar da vida.
Dois irmãos, um de quatro anos e outro de alguns meses (ainda nem conseguia engatinhar) chegaram ao orfanato. Eles foram abandonados pelos pais, que não tinham mais condições de sustentar os três filhos e decidiram ficar apenas com a menina (irmã gêmea do menor). O maior ficava em um canto da sala, aos prantos, segurando o pequeno no colo, dando a chupeta para ele e não deixando ninguém chegar perto. Às vezes ele levantava, corria até a porta gritando e voltava abraçar o pequeno novamente. O choro dele era de uma tristeza profunda, ele gritava e se debatia como eu nunca vi e nem imaginei ver em toda a minha vida. A dona do orfanato conversava com ele, nós havíamos comprado biscoitos de chocolate para as crianças e tentamos dar um pacote para ele, mas nada fazia com que ele se acalmasse. Até as outras crianças, que na maioria das vezes estavam se “matando”, chegaram perto para tentar consolá-lo. Foi só o cansaço que conseguiu vencer a tristeza do primeiro dia de abandono e fazer com que ele dormisse. E somente depois dele dormir a Mila conseguiu pegar o menor no colo e dar mamadeira, que ele tomou toda em poucos minutos.

Depois dessa cena a noite não foi fácil. Já estava triste porque era nosso último dia e havíamos começado a nos despedir das crianças, alguns com carinha de choro, outros nem entendendo o que estava acontecendo.
Mais difícil foi passar a noite me questionando sobre o porquê destas coisas acontecerem. Porque alguns tem que passar uma vida se privando de muitas coisas, enquanto outros passam reclamando, mesmo tendo de tudo? Por que crianças indefesas acabam tendo que levar uma vida sem uma família, sem receber o carinho diário dos pais, tios, primos, etc, enquanto outros tem tudo o que querem e acabam nem valorizando? Por que esses dois meninos foram escolhidos para “perder” a família? O que está passando na cabeça deles? Imaginem a dor de se sentir abandonado, largado em um lugar que você nunca viu antes, cheio de estranhos? Acho que nunca vou encontrar respostas para isso.
Passar esses períodos em orfanatos, onde as crianças não tem quase nenhum conforto, onde dependem da boa vontade de outros para ter comida, água e moradia diárias, tem me ensinado a dar mais valor às coisas.
Tenho aprendido muito com as crianças, principalmente a valorizar coisas pequenas que não conseguimos comprar com dinheiro: um abraço, um sorriso, uma brincadeira boba, um monte de crianças em volta. Espero que daqui para frente eu não reclame mais por causa de coisas bobas.
Mas não quero desanimar ninguém que esteja pensando em voluntariar em orfanatos. Garanto que no final há muito mais momentos felizes do que tristes. Além disso, estes momentos tristes nos fazem crescer. Vale a pena!